sábado, outubro 08, 2005

Alice (2005) de Marco Martins



Surge como o filme português mais bem referênciado do ano, depois de uma passagem de sucesso pelo Festival de Cannes. E a verdade é que Alice, a obra de estreia de Marco Martins justifica a onda de entusiasmo, juntando-se com justiça ao grupo dos bons filmes do ano. Não vou dizer que se trata do filme que pode reconciliar o público português com o seu cinema, isto porque não estamos de forma alguma perante uma obra acessível a todos os tipos de público. Trata-se de um retrato aprofundado de um pai que tenta desesperadamente encontrar a filha desaparecida. O ritmo é lento, e a história faz-se de rotinas, de repetições, que funcionam como o reflexo da vida do próprio protagonista.

Baseado num grande número de histórias verídicas, o filme é-nos apresentado como um retrato crú, não apenas do tema que aborda, mas debruçando-se também sobre o distanciamento e a frieza das relações humanas nas cidades modernas e também um pouco sobre a função da televisão e dos meios audiovisuais na sociedade, nomeadamente na própria criação de esperanças e sonhos a que muitas vezes lhes associamos. Mas aqui tudo é cinzento, tudo parece distante e inacessível, nas grandes ruas de Lisboa (como poderiam ser de qualquer outra cidade), onde a esperança de um só homem se pode perder na indiferença de milhões. Destaque para o excelente trabalho de Nuno Lopes, irreconhecível e tocante na composição de Mário, o pai de Alice, capaz de carregar às suas costas todo o filme, e ainda para a forma como Marco Martins conta a sua história, com a câmara sempre à distância certa das suas personagens, sem nunca se permitir cair em sentimentalismos falsos. Um filme a descobrir.

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