segunda-feira, outubro 17, 2005

Last Days (2004) de Gus Van Sant



Blake é um jovem atormentado pelo peso do sucesso, uma estrela que vive momentos de agonia e de um pânico silencioso de si mesmo e dos outros. Last Days é assim uma viagem ao mundo de Blake, ao mundo que ele concebeu para si mesmo e no qual não existe espaço para mais ninguém. Esta é a premissa da qual o filme parte, sendo óbvio no argumento de Gus Van Sant a referência, já assumida, ao lendário líder dos Nirvana Kurt Cobain.

Para reviver os últimos dias de Blake, Van Sant escolheu Michael Pitt, um jovem já experiente nas lides cinematográficas e, coincidência ou não, muito parecido fisionamente com Kurt. No entanto, não só das semelhanças físicas vive o desempenho de Pitt, mas sim da sua capacidade de dar corpo a todo um estilo "grunge" que acompanha toda a película. É nisto que Michael Pitt é brilhante sendo, claramente, o melhor do filme. No entanto, também ele se torna refém de um argumento que tem uma ideia central clara e específica, mas que acaba por se diluir no deserto de ideias de Gus Van Sant, que não teve arte e engenho suficientes para conseguir construir um argumento e desenvolvê-lo à altura das pretensões do filme. Exemplo claro deste aspecto é a presença de personagens secundárias irritantemente dispensáveis que nada acrescentam ao filme. Teria sido preferível Blake estar sozinho na mansão do que partilhar a casa com aqueles seres algo fantasmagóricos, que surgem e desaparecem sem dar nenhum contributo à acção principal. Penso que se conseguiria mostrar o mundo do protagonista de uma outra forma, mais coesa e interessante.

Outro aspecto, também da responsabilidade de Gus Van Sant, prende-se com o seu estilo de realização. Na verdade, é notório o afastamento da câmara das personagens, em especial de Blake, o que evidencia ainda mais a referência a Kurt pois raramente aparecem planos de pormenor da cara de Pitt. A ideia tem conteúdo e de facto é bem conseguida, tal como os grandes planos de sequência que este imprime na narrativa. Em Last Days, Gus Van Sant oferece aos espectadores sequências de acção de 10 minutos de um único plano que, feito raras excepções, resulta muito bem. O mesmo não se pode dizer da utilização, neste filme, de uma das técnicas que já havia experimentado em "Elephant", ou seja, filmar a mesma cena de diferentes pontos de vista, referentes às personagens. Mas, se no seu anterior filme fazia algum sentido, aqui é completamente despropositado, pois o único foco de interesse é Pitt.

Para terminar queria destacar duas cenas do filme que, só por si, merecem a ida ao cinema. A primeira, o grande momento musical da responsabilidade de Pitt que compôs, tocou e cantou a música que nos apresenta no filme. A segunda, e sem querer revelar o final, se bem que toda a gente o sabe, o desfecho de Blake, que é, do ponto de vista artístico, muito metafórico mas extremamente tocante.

Assim, ao sair da sala de cinema, o meu principal sentimento era decepção. Não que o filme seja mau, mas não tem a qualidade que se exige a alguém que já nos trouxe obras como Good Will Hunting, principalmente quando o grande problema do filme está na pessoa que o pensou e idealizou: Gus Van Sant.

P.S - Há uma semana que vi este filme mas, estranhamente, existem cenas que, pela sua genialidade, ainda não consegui esquecer. Assim, e após uma reflexão prolongada, decidi alterar a classificação dada anteriomente pois acho que subvalorizei o valor desta obra. E, como um revisionamento, é possivel que volte a alterar a classificação.
Classificação: